Pelas ruas das cidades...
Olhando a realidade que nos cerca
e marca, a tensão existente entre dignidade e liberdade volta sempre à tona. Vivemos
uma realidade desprovida de modelos, de valores e de horizontes, não é pessimismo
é realismo. Esta visão pode ser parcial, limitada e pequena, porém não é
alienada. Olho a partir da vida das
juventudes – esta categoria está aberta e não suporta segregações econômicas ou
geográficas, de raça ou de cor. Ao analisarmos os mundos dos jovens
perceberemos que independente de suas realidades, eles sofrem cada um em seu
tempo e situação a sua alienação própria, seja na favela ou no condomínio de
luxo.
A grande tensão está entre a
dignidade e a liberdade. Em nome da liberdade perdemos a dignidade, como se a
norma, a lei, o equilíbrio, fosse um perigo à liberdade. Os jovens têm medo de
viver aprisionado a normas e “correntes antigas” de pensamento, seja da família
ou de outra instituição; tem medo de perder a liberdade. A vida dos jovens nos
revela essa liberdade? Não. Hoje estamos diante de uma massa alienada e
indiferente a muitas iniciativas inteligentes de mudança de pensamento e
realidades.
Os jovens hoje vestem as mesmas
marcas de roupas, perfumes, celulares, sapatos e apetrechos... A diferença está
na autenticidade ou não do produto, mas as marcas são as mesmas, os corpos são
os mesmos, malhados os rapazes e magrinhas as moças como manda o figurino. A
ditadura da beleza se impõe hoje sobre o jovem que já está sob a ditadura do
prazer. Porém, na tensão entre estas ditaduras, há uma mudança que marca
profundamente a realidade da juventude, o que importa é estar bonito, bonita,
mesmo que isso não me traga tanto prazer no processo para chegar ao ponto
desejado (academias, jejuns e regimes, corpos furados e perfurados,
tatuados...). Sem falar que a intensidade na vida dos jovens está na busca e
não no encontro – relações vazias e sem sentido e sentimento – artificiais –
passageiras e precoces – não há lugar para a intensidade. A vulgaridade dos programas televisivos e
jogos que usam dos jovens para a exposição de seus produtos, transformando os
próprios jovens em produtos, estão revelando cada vez mais as contradições
desse sistema de relações e de valores apresentados á juventude como modelo de
felicidades. Um belíssimo filme nacional “é proibido proibir” nos mostra esta
tensão bem de perto, ou basta citar o que testemunhamos acontecer diante de
nossos olhos e dentro de nossas realidades a partir do momento em que alguém
tem a coragem de ver o BBB em suas mais variadas edições.
A busca do prazer x as religiões sem norma.
Ao sair nas ruas encontramos outra tensão clara a busca do prazer x religião, nossas periferias estão abarrotadas de bares, academias e igrejas. Em Salvador é possível encontrar uma igreja que é concorrente de si mesma, na mesma rua e na mesma calçada podemos encontrar a mesma igreja numa distancia de poucos metros. Sem falar das mais diversas concorrentes com placas distintas. Cada bar, academia ou igreja tem seu objetivo: o bem comum.
Porém, de maneira bem diferente. A questão que fica quando
nos aproximamos deste universo é: o que está por trás de tudo isso? Quem será
capaz dar suporte quando esta bomba estourar? Nas periferias encontramos homens
e mulheres abarrotados de TVs novas, sons, carros, e muita bebida alcoólica,
uma forma de expressar o poder de compra da população. Porém, não se encontra
em qualquer esquina a felicidade e a realização pessoal. Há um grande número de frustração em tudo
isso. O lazer transformou-se em fuga da realidade, ele não ajuda a descansar e
a relaxar, pelo contrario, ele está para o vazio que cada um carrega e não tem
coragem de enfrentar.
Um mundo equivocado e controverso como o nosso não pode
ser levado a sério é verdade, porém está fabricando um monte de pessoas
machucadas, desiludidas e alienadas, vivendo distante de sua verdadeira
realidade sem a menor condição de pensar o amanhã, sem a capacidade simples de
projetar a sua vida. Mais que nunca buscam viver o dia de hoje (quem sou eu?),
em detrimento do amanha e do futuro (para onde vou?), esquecendo o seu passado
(de onde eu vim?).
O que me entristece é ver o quanto
os jovens se alegram com pouco e até mesmo com o que está em seu horizonte
simbólico, simplesmente ignoram as oportunidades que existem no Brasil de hoje
como oferta de uma realidade diferenciada. Embora muitos estejam aproveitando a
grande maioria está distante de construir um horizonte mais maduro e seguro.
Para muitos a saída está na religião
fácil do “aceitar Jesus” buscam no ambiente religioso uma saída superada para
suas vidas, porém esta atitude é tão intimista que não passa disso: um grande
desejo de converter as atitudes de pecado em vida nova e participar de um grupo
tendo como elemento expandir e multiplicar os fiéis, em detrimento da religião
predominante, no caso o catolicismo. Importante ressaltar que mudar de religião
aqui, nem sempre significa mudar de vida, pois, hoje a religião está mais
conivente com o mercado, ela se adapta a necessidade do cliente a fim de satisfazê-lo
a todo custo, inclusive aliviando as regras e normas, transformando o Evangelho
num produto.
Quando analisamos a realidade das
juventudes não deixo de fora os adultos, afinal são eles quem produzem na
maioria das vezes instrumentos de manipulação dos jovens. Dessa forma, acredito
que é chegada a hora de continuar crendo que há um caminho alternativo para o
que vivenciamos no mundo de hoje. Já nos
dizia Câmara Cascudo que, “o melhor produto do Brasil é o brasileiro” vejo
nesta frase, adaptada a este contexto que temos em nossas mãos a capacidade de
criar e gerar alternativas que possam nos tirar do labirinto que vivemos
atualmente. Creio que a dignidade das pessoas pede espaço enquanto sobrevive em
meio ao proselitismo da falta de pudor e de perspectiva e horizontes. A sensação
que temos no momento de desanimo não pode ser generalizada uma vez que há quem
busque saídas para o que vivemos. É necessário pensar, refletir, produzir,
criticar, opinar... Interferir. Nem tudo está perdido. Será?
Caminhem pelas
ruas das cidades ou liguem suas televisões e tirem suas conclusões...
Laércio.sj
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