Ide e incendiai o
mundo
Creio que todas as pessoas que
possuem o juízo no lugar, possuem medo do fogo. Um incêndio traz em si uma
tensão, a imagem do fogo é linda, porém, sabemos que num incidente, há também
no fogo muita destruição. Porém, somos cristãos! Jesus mesmo em seu evangelho
nos diz que veio para trazer o fogo Lc 12,49 “Eu vim trazer o fogo a terra...”
Esse é Jesus, e nós que devemos fazer?
Diz a tradição inaciana que Santo
Inácio de Loyola ao enviar os primeiros companheiros em missão, isso no século
XVI, ele havia dito “Ide e incendiai o mundo no amor de Deus...”, ou seja,
incendiar é a nossa vocação, afinal estamos seguindo os passos de um
“incendiário” que veio trazer fogo à terra. Inácio entendeu bem o recado de
Jesus e logo deu continuidade a sua missão de incendiar no amor de Cristo.
Incendiar sempre,
não acomodar-se!
O comodismo e a alienação são dois grandes pecados da humanidade nos
dias de hoje. O individualismo leva o ser humano a pensar só em si mesmo. Por
isso, incendiar dá muito trabalho. O comodismo hoje gera homens e mulheres
alheios a tudo, em alguns cantos do mundo, é verdade, estão aparecendo focos de
incêndio que nos fazem querer mais fogo. Como por exemplo, o “Movimento dos Indignados”
em Roma, New York, Londres... de alguma forma estão inconformados e não ficaram
em casa acolhendo tudo indiferentemente, o gesto deles, aquecem o desejo de
transformação nos outros indignados que começas a mostrar o rosto e vão às
ruas.
Reagir é preciso! Incendiar é necessário – olhar para o mundo gélido,
sem fogo, desanimado e acomodado no erro do subjetivismo, da frieza do coração
humano diante das atrocidades que se tornaram tão comuns, deve sempre nos levar
a uma santa indignação – ao profetismo.
A postura dos indignados, dos profetas, dos “incendiários” nos faz
refletir que não estão buscando mais do mesmo. Em tempos de globalização, as
músicas, as roupas, o espiritualismo, o comodismo, o terrorismo, tornaram-se
também algo corriqueiro em nossa vida e estão sempre diante de nossos olhos e não fazemos nada, apenas nos conformamos ou
ficamos procurando culpados. É preferível permanecer descrente e distante, para
não se queimar. Isso significa abrir mão da possibilidade de viver uma alegria
contagiante e aquecida pela teimosia de ser diferentemente parecidos com Jesus,
a ser deprimentemente igual a tantos que não dizem nada, não influenciam em
nada, não fazem a diferença, não possuem fogo necessário para aquecer o coração
de ninguém, pelo contrario, “apaga a chama que ainda fumega”. Para tanto, é
necessário que cada pessoa tenha a coragem de sair do seu mundo limitado, fechado
e voltado pra si mesmo e ir ao encontro da verdadeira chama que nunca cessará.
Como abrasar o próprio coração em pleno século XXI?
O fato de estarmos numa sociedade
pós-moderna, não significa que todas as respostas para nossas perguntas estejam
atreladas à pós-modernidade. Nem por isso, poderemos dizer que estamos buscando
respostas antigas para problemas novos, afinal o problema do ser humano
permanece sempre o mesmo desde o início do mundo: como viver bem, como alcançar
a liberdade e a felicidade... Metas bem conhecidas do ser humano em todas as
gerações e período históricos. Também aqui não significa que, para querer
incendiar o mundo de hoje, tenhamos que reinventar o fogo, basta apenas deixar
que ele queime sempre, aqueça sempre e até mesmo purifique. Temos que passar
pelo fogo, como o ouro e a prata.
Como vemos, o desafio está posto:
manter o coração aquecido, como também, buscar a chama no lugar certo e
certificar-se que o fogo recebido não é um fogo cenográfico. Encontrar focos de
incêndio hoje que possam reacender a nossa chama é uma missão difícil, porém
fundamental. Encontrar lugares em que a Palavra de Deus continue sendo acolhida
e valorizada.
A caridade, a justiça social e a
oração, são três caminhos seguros para o encontro com a chama, com aquele que
queima o nosso ser - “é como a chuva que lava, é como fogo que arrasa, Tua
Palavra é assim, não passa por mim sem deixar um sinal”.
A escuta da Palavra de Deus, será
para nós um caminho seguro neste processo de desejar encontrar a chama e manter
o coração aquecido. Sem ela não teremos condições de incendiar nem nossa vida,
imagine o mundo. Pois, é pela Palavra que conhecemos a Jesus, lá descobrimos
Jesus na vida do irmão, local quente, aquecido.
Tendo encontrado a chama, o fogo
que não se acaba, é chegada a hora de colocar em prática aquilo que a chama nos
apresentou e iluminou, é hora de transmitir. Nós somos comunicação, somos relação. É hora de incendiar, aquecer... gastar a
vida, deixar-se gastar, queimar...
O fogo que Jesus veio trazer nos
purifica e revela a nossa verdade. O fogo que vem do coração de Deus, do céu,
nos aquece e envia. Trazer de volta a alegria de viver é missão de quem tem o
coração alegre e aquecido. Santo Alberto Hurtado (jesuíta do Chile) no caminho
de Inácio de Loyola, nos revela a nossa verdadeira vocação, que é no frio das
relações deste mundo tão banal e artificial que devemos ser “um fogo que acende
outros fogos”, sermos tochas, velas... luzes... ao apontar para outra
possibilidade de vida a iluminar esta sociedade cinza, como diz o Pe. Libânio. Pe. Laércio.sj
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