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sexta-feira, 4 de novembro de 2011

A dor da Religião Equivocada


Crer é um ato profundamente característico do ser humano, eu diria que é um dos atos que o caracterizam, afinal, animais irracionais não crêem. Ultimamente tenho visto que a abertura do ser humano ao ato de crer equivocado pode ser também, uma brecha para o ato de sofrer! Em breve creio que poderei ter explicado bem esta afirmação.
O ato de crer não está relacionado apenas ao ato religioso, uma vez que cremos, por exemplo, que no horário certo e combinado previamente o metrô passará na estação X no horário Y, a não ser que algum incidente o atrapalhe em seu percurso. Crer que o dia vai amanhecer, que o sol vai nascer, que a lua aparecerá... Tudo isso implica o ato de crer. Mas, é do ato de crer religiosamente que eu quero refletir – crer nunca foi tão perigoso! Mesmo que relembremos das cruzadas, das fogueiras, das brigas teológicas antigas e modernas, acredito que o ser humano nunca esteve correndo tanto risco como antes... se olharmos para nossa realidade hoje e os conflitos existente até hoje nos surpreenderemos, por exemplo vejamos o conflito de Darfur (conflito armado no oeste do Sudão -  com características étnicos culturais e religiosas) a Organização Mundial de Saúde estima um numero absurdo de 50 mil a 450 mil mortos... Vejamos outro número alarmante: em todo o mundo são mortos 150 mil cristãos por ano, o que estão chamando de “cristãofobia”. Olhando para nossa história podemos lembrar que entre os próprios cristãos, muito sangue já se derramou. Um luterano chamado Benedict Capzov (fanático) foi responsável por mais de 20 mil mortes de bruxas no século XVII, sua tese estava embasada no antigo testamento que pede para que não deixem viver as feiticeiras.

 Na Alemanha, as posições de Lutero levaram à morte mais de 30 mil camponeses anabatistas. Na história da Igreja Católica foi em 1231 que o Papa Gregório IX lançou a bula Excommunicamus, através dela era estabelecia a Santa Inquisição.  Certamente são dados que nos colocam numa situação complicada, uma vez que hoje, nos é inconcebível tais atitudes. Tudo isso é de fato vergonhoso, porém o que dizer das formas de violências modernas em pleno século XXI e em nome de Deus e da religião? É verdade a Inquisição passou, porém, vemos outro tipo de morte e atrocidade acontecendo. O crente hoje em pleno exercício de sua liberdade de poder pensar e viver livremente a sua fé como direito legítimo concedido é usurpado e violentado de outro modo, pois se vê enganado e manipulado por falsas experiências religiosas que tiram e arrancam o senso crítico das pessoas, tornando-as simples objeto de manipulação e controle responsável pela manutenção da indústria religiosa presente hoje em quase todo o mundo.
A religião equivocada faz uso do ato de crer de vários e milhares de seus fiéis, controlando e manipulando suas ações, interferindo em suas vidas, e lavando suas mentes e seus corações. Vejamos o que acontece aqui no Brasil, qualquer sala de esquina de rua vira “igreja”  com a pretensão de enviar ao céu o seu rebanho, mesmo que seja este apenas sua família e seus amigos mais próximos, que visitam sua antiga mercearia ou bar, agora transmutada em igreja.
A violência é grande, certo dia, lá na Cochinchina,  chegou uma senhora decepcionada pelo fato de ter pedido emprestado ao seu “pastor” dinheiro para pagar em duas parcelas, uma quantia de 600 reais  destinada a quitar o aluguel de sua casa. Obvio o pastor não a emprestou e isso foi a causa de sua frustração, pois certa época ela já havia “socorrido” a sua igreja com a poupança que possuía guardada, o pastor a desafiou a ser generosa para que pudesse receber mais de Deus.  Assim ela fez. Hoje, desempregada e sem poupança, ela segue sofrendo. A população é vitima do “sagrado” as pessoas são simples e se confiam entregando tudo que possuem, no desejo de ver a vontade de Deus acontecendo em suas vidas.  A dor é grande, o sofrimento é intenso, a cegueira é grande. Não podemos generalizar os fatos narrados, porém, precisamos tomar consciência que há uma nova ordem em meio ao religioso pós-moderno que suporta estas posturas e posicionamentos, O FANATISMO –  o grande inimigo da religião. O fanatismo ensoberbece e cega, envaidece, massacra a liberdade e não se abre ao diálogo com o diferente. Tudo isso em nome de Deus e da religião. A experiência de crer, neste sentido, quando mal administrada, cria mais dificuldade para a aproximação do e com o sagrado.   A imagem de Deus fica condicionada ao bom humor do ser humano... falta a lucidez e a lealdade, a sinceridade, a verdade.
Por isso, nunca deveremos abrir nossa boca e dizer que, o que vale é buscar a Deus, ou que tudo é igual e Deus é o mesmo... Dizer isso pode até parecer pós-moderno e bonito, porém não é verdadeiro. O racionalismo e o fundamentalismo,  são atitudes que mesmo sendo tão antagônicas parecem irmãs uma vez que o racionalismo se fecha na experiência empírica e o fideista, se segura na fé, no subjetivo, abrindo mão da razão. Com certeza esta não é a nossa postura, nem a Igreja incentiva esta atitude fechada e descabida na atual conjuntura eclesial e social. Dialogar é a palavra chave para resolver qualquer dor e até mesmo, para mudar a concepção de Deus e de mundo. Só assim, poderemos ser mais cristãos, mais fiéis, mais fortes... e deslocaremos do centro da religião de hoje a competitividade e a tentadora postura de escolher a sua religião de um modo “a la carte” e  muitas vezes desleal.
Por isso, renovar a fé, professar a fé constantemente e em comunidade nos transforma em homens e mulheres capazes de entrar num grupo, de conviver em fraternidade e de dialogar -  partilhar experiências sem querer queimá-los, desmerecê-los ou mesmo condená-los ao inferno dos loucos... Aquele em que estão lá apenas os que discordam de meus pensamentos.  

Crer ainda é possível sem ser manipulado?

Certamente que sim, principalmente quem não tem medo do novo, do desconhecido, do questionamento, da pesquisa, do estudo, da oração sincera.  
Crer religiosamente será possível e bem melhor, quando descobrirmos que somos o que somos pelo fato de podermos nos reconhecer em nós, e nEle o “totalmente Outro”, não como alguém intrinsecamente separado do humano, mas pelo contrário, aquele que se revela o Outro, no outro que está ao meu lado, neste mundo. Um Outro acessível e possível de “tocar”. Porém, este Outro não poderá ser visto como o que manipula ou é manipulável, o que me tira a liberdade e sentido da existência, pelo contrário, Ele quem me cede a capacidade de crer e de não crer, sou livre.   Ele quem se revela ... a ação é dele.
Crer na e em liberdade (o que é diferente do individualismo religioso) é possível, acreditar que somos filhos e filhas livres é possível...  O melhor mesmo seria que não precisássemos da religião para aplacar nossa dor, para livrarmos do demônio e para nos garantir seguranças neste mundo, mas sim para nos conduzir a Deus pelos caminhos da verdade que é o próprio Cristo. Se não for desse modo, a religião dói e faz doer -  o fanatismo impede a liberdade e mata -  aqui está a dor do ato de crer de um modo equivocado, a dor da religião equivocada que nos priva da verdadeira religião que é o amor e a justiça.
 Pe. Laércio.sj


Um comentário:

  1. com certeza temos que viver hoje e mais que nunca uma Fé, e como fala minha querida professora Sylvia Leão,: A FÉ É RACIONAL. Daí devemos responder por nós mesmo a essas questões: O QUE FIZ, O QUE FAÇO E O QUE FAREI POR CRISTO? E qual o Cristo que sigo? o Cristo que invade o templo expulsando os vendedores dali falando que sua casa era de oração e não de comércio, o Cristo que cura, que alimenta, que ensina?...Fragmentam-se Cristo para justificar um pensamento, interesses particulares, lembrando que o todo é formando de partes e que cada parte é importante para conseguimos compreender a universalidade que é Cristo.

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